terça-feira, 19 de março de 2013

Falmouth Harbour, Antígua e Barbuda, 19-03-13

[18-03-13]
Escrevo na pérgola do Reef Gardens, um dos meus lugares favoritos no mundo. Ao longe, Monserrate não se vê, envolta em núvens. Está normal; nos últimos dias tem estado claramente visível, as suas três bossas a fazer lembrar o monstro de Loch Ness ou um dragão semi-submerso, penacho de fumo a sair-lhe das narinas. Mas tanta visibilidade tanto tempo é rara nestas paragens quentes e húmidas.

Da baía também exala o habitual silêncio; é espantoso como esta paisagem consegue apagar os sons todos que lhe são estranhos: a conversa do casal numa das mesas do jardim, o zumzum do tráfego nesta hora de regresso a casa, o ocasional avião. Quando olho para a baía tudo o que vejo é silêncio, barcos fundeados, silêncio, um dinghy a puxar um esquiador, em silêncio e tão longe que parecem miniaturas. Tudo parece a cena de um filme ao qual um Deus misericordioso tivesse tirado o som.

A harmonia - palavra que há quatro meses não me ocorre - volta, pouco a pouco.

Penso muitas vezes que Bequia é o lugar onde morrerei, se esse mesmo Deus misericordioso mo conceder; Antígua, em contrapartida, é um lugar de vida, com seus altos e baixos, os seus cumes e abismos, harmonias e convulsões.

O silêncio continua: palpável, sólido como betão armado, visível. Um pequeno sloop sai da baía, pano todo em cima; o sol aproxima-se da colina atrás da qual sei que se esconderá daqui a pouco; penso que antes disso tenho um churrasco no A., para o qual P. simpaticamente me convidou. Sinto-me como se estivesse a chegar pela primera vez aqui. A harmonia é um país novo.

Sei que vou demorar muito tempo a subir a íngreme, longa e solitária encosta que tenho pela proa; sei que um dia serei de novo feliz, e que amanhã não é a véspera desse dia. Mas só me interessa o destino, não o tempo que demorarei a atingi-lo. Olho para esta baía, para este silêncio e é esse destino que vejo, essa felicidade que me espera ao longe. Eles não mentem.

Os mastros e os brandais brilham, com o sol a bater-lhes quase na perpendicular. Ontem via neles as barras de uma prisão. Hoje vejo instrumentos musicais mudos; conheço-lhes tão bem os sons... Em breve os ouvirei de novo.

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