sábado, 10 de março de 2012

Parnaíba, Piauí, Brasil, 10-03-2012

Mal sinto os braços; cada vez que bebo um golo da cerveja temo que a garrafa me caia das mãos. É provável que daqui a pouco consiga andar, mas não tenho a certeza.

Ou seja: o camião está carregado.

No topo do topo éramos quatro, entre os quais um senhor de setenta anos; no resto dois, Edgar e eu. Um mastro (de madeira), duas quilhas (encharcadas de água), dois lemes, um tambor de cabo aço de 12mm (este foi fácil, duas pranchas minimizaram o problema), duas folhas de policarbonato e uma série interminável de caixas, caixinhas e sacos. Vim no camião do estaleiro a casa de G. O mastro tem quinze ou dezasseis metros; o camião oito. A única coisa que disse a Gildemi, o dono da empresa de camionagem, foi "devagar", e que amanhã diga o mesmo ao seu motorista : d-e-v-a-g-a-r.

Claro que isto não passa do primeiro degrau de uma escada longa: amanhã o camião deixa Parnaíba e tem cerca de 500 quilómetros a percorrer até chegar a S. Luis. Tudo pode acontecer, nesses 500 quilómetros; mas talvez não aconteça nada, não sei.

Atravessa-se uma ponte de cada vez; nesta entrámos agora. Dela sairemos na segunda-feira de manhã, talvez. Por agora penso em agora, só. No bom jantar que vou comer, nas cervejas que bebi em casa de G., onde estavam as últimas caixas e sacos que carregámos, na caipirinha sem açúcar que uma jovem senhora com uma sublime cara de idiota chamada Arlaine prepara magnificamente.

Metade de B. sai de Parnaíba amanhã. Metade de mim saiu de Parnaíba hoje.

O problema que se me põe agora é saber se saio sexta-feira, caso B. esteja pronto para a viagem. Não sou supersticioso, mas sair a uma sexta-feira para uma viagem destas parece-me correr um risco inútil. Já há tantos.

(Antigamente os marinheiros eram pagos à sexta-feira. Um capitão que pensasse sair nesse dia não tinha, pura e simplesmente, ninguém a bordo. Isto deu origem a uma superstição: não se larga a uma sexta-feira de um porto. Os marinheiros são pessoas pragmáticas.)

É uma questão deliciosa.

II
A ponte é um arco muito leve, a trinta metros do café onde um jovem toca, esforçadamente. Por baixo há dezenas de mesas com cadeiras de plástico encarnadas, da Devassa, uma marca de cerveja. Aquele lado da esplanada está cheio. Quem estava perto do café, do lado de cá da rua, foi para lá. Só eu resisti, porque a simples ideia de me levantar provoca dores diversas em quase todos os músculos.

O rapaz toca alternadamente muito bem e muito mal; ou então sou eu que tenho um short attention span.

Consegui atravessar a rua e mudar de mesa. Uma lança em África.

Percebo mal esta cidade, não sei se por preconceito, se por snobismo se - mais provavelmente - porque não tenho paciência.

O rapaz vinga-se do afastamento do seu público e toca cada vez mais alto.

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