terça-feira, 23 de outubro de 2012

Palma de Mallorca, Baleares, Espanha, 23-10-2012

«Esta cidade de bicicleta é outra coisa.» Tens razão. Gosto de coisas fáceis. Falmouth Harbour, por exemplo: chegar ao trabalho a pé em cinco minutos, chegar ao supermercado a pé em cinco minutos, chegar à praia a pé em cinco minutos, chegar ao bar a pé em cinco minutos, ter o mar no quintal. Palma de bicicleta é tão fácil que consegue fazer crescer a nossa simpatia por ela, coisa muito difícil. 

Mas mais difícil parecia ser conseguir alugar as bicicletas (pesadas, sem mudanças mas adequadas às ciclovias e estradas da cidade, muito planas e sem surpresas): primeiro, pediram-nos fotocópias dos documentos de identificação (o cubículo não tinha fotocopiadora); depois, as fotocópias não serviam, era preciso dois passaportes em vez de um passaporte e uma carta de condução -- eu prefiro deixar o passaporte em casa, não vá perdê-lo, de maneira que tive de ir buscá-lo a casa; à terceira foi de vez, mas demorou eras, porque a senhora não se decidia sobre que bicicletas nos entregar (uma delas, afinal, até tinha o cadeado avariado) e íamos ficando com o troco adiado, porque a senhora não o tinha àquela hora da manhã. Uma hora e meia depois pedalámos a caminho do Club de Mar, para fazer dockwalking (uma prática relativamente humilhante que consiste em ir de barco em barco pedir trabalho) e enfim, esta cidade de bicicleta é outra coisa. O frio outonal da manhã transformou-se rapidamente em calor. A viagem que nos levava quase uma hora a pé e uma eternidade imprevisível se esperássemos pelo autocarro fez-se em 15 minutos. Muitos barcos e conversas depois o desânimo desapareceu quase por completo: encontrámos conhecidos, enviámos CVs e tivemos alguns nãos, que são pelo menos mais certos que muitos talvez.

Fiquei a conhecer, ao almoço, a Casa Júlio onde decidimos, se a vida nos deixar, ir visitar o Júlio a Évora em breve. A comida estava uma delícia e os sorrisos dos empregados também. Não há nada melhor do que um restaurante sem turistas numa cidade turística, tirando, talvez, a casa de alguém que nos espera com a mesa posta.

À tarde, fizemos um passeio de bicicleta até ao Arenal. Uns oito quilómetros apenas, sempre à beira-mar, passando por praias e pueblos, novos de bicicleta, trotineta, cães de trela e velhos de bengala ou cadeira de rodas conversando com quem os cuidava. Os maiorquinos, tenho reparado, tratam bem os seus velhos. Dão-lhes carinho e atenção e, sobretudo, acompanham-nos na rua. Há muitos velhos sozinhos, mas os que estão acompanhados por gente mais nova são incomparavelmente mais do que os sozinhos, geralmente de aspecto mais teso que vulnerável. Gosto de uma terra que cuida dos seus velhos. Tenho saudades dos meus -- das minhas, agora, que os meus já estão, dizem, num lugar melhor.

O pôr-do-Sol na Baía de Palma é inesquecível como todos os outros. Ver algo de singular no mais banal e repetido dos fenómenos é como andar de bicicleta: nunca se desaprende.

1 comentário:

  1. Ter o mar no quintal é belo :)

    Também gosto de uma terra que não deixa os seus velhos morrer de solidão. E de ver o mundo que vês pela tua mão.

    ResponderEliminar