quarta-feira, 8 de maio de 2013

Marina Puesta del Sol, Estero de Aserradores, Nicarágua, 08-05-2013

Por vezes penso que estou em Quepos e começo um texto com "Estou em Quepos. Esta foi a minha última viagem". Não estou, não será.

Estou na Nicarágua, num buraco para ricos para o qual viria de bom grado com um bom livro e uma má companhia; ou boa que fosse, a companhia. Desde que o livro fosse bom... O rum é. Chama-se Flor de Caña, não vale um  Mount Gay, nenhum vale excepto alguns vinte ou trinta nos quais não quero sequer pensar, porque este é bom, levezinho, agradável, vai bem com o espaço e com a viagem.

Em Portugal chamaríamos a isto uma ria. Um golfo profundo, parece um rio, com múltiplos braços, como se estivéssemos num delta. Não foram a música e o rum e sentir-me-ia em África, esta imobilidade - nada se mexe, nem as pangas que começam a sair para a pesca, a senhora do bar que serve as duas ou três mesas ocupadas como se o bar estivesse a abarrotar, a água que agora vaza, lentamente. Como se tudo estivesse congelado no calor, prisioneiro do calor, do tempo, do espaço, da ideia que nada disto é verdade, é um filme do qual sou o espectador meio cego, meio surdo, meio.

A luz é branca, leitosa, quente, como se alguém tivesse embaciado o vidro de uma janela e eu estivesse do lado de fora a olhar para o mangal, para estes pontões vazios, para o mangal, para o dia que acaba como acabaram estes dias todos desde São Francisco: um dia estarei em Quepos e direi "esta foi a minha última viagem". Não será.

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O quadro é semelhante ao de El Salvador, com a diferença do espaço: lá senti-me num aquário, não havia cem metros livres qualquer que fosse a direcção para a qual se olhasse.

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Preciso de solidão como a luz de espaço.

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